sexta-feira, setembro 08, 2006

Comigo...

(...continuação)
- Queres vir a Muros? – pergunta à Raquel. – Nós vamos agora.
- Acho que não – respondo sombriamente –, vou ficar por aqui. Tenho umas músicas para pôr em ordem.
- Está tudo bem, Diogo?
- Está! Claro – simulo um sorriso.
- Andas estranho... – diz desconfiada.
- Impressão tua, são os domingos – digo, enquanto lhe dou um beijo que sei que a vai sossegar.
- Hum... Até já então.
- Hum... Até já
Espero que toda a gente saia para logo a seguir me meter no quarto e pegar na guitarra. Começo por tocar umas variações em Lá menor de uma música que ando a compor e que estou a pensar gravar em estúdio no fim do mês, acabando por dar comigo a tocar o wish you were here dos Pink Floyd onde por alturas da passagem “we´re just two lost souls swimming in a fish bowl, year after year” me vêm momentaneamente as lágrimas aos olhos. Depois de tocar umas cinco ou dez vezes essa música comecei a mexer nas coisas do quarto, à procura de algo como emoções esquecidas tentando limpar o pó que se acumulou na minha memória. Abri e fechei gavetas e armários, experimentei um velho chapéu de palha que costumava usar aqui, descobri algumas fotografias antigas, e um livro do Valerian o-agente-espacio-temporal que devia ter ficado a ler para não encontrar o que não procurava. E o que não procurava e muito menos precisava de encontrar era um poema que a Bárbara me havia dedicado pouco antes da nossa separação, há uns... três anos. A data está lá, mesmo no fim do último verso, para assegurar da inexorável passagem do tempo a pessoas para quem, tal como eu, três anos não são uma fracção de tempo mais prolongada que a diferença de ontem para hoje. Esta revelação deixa-me de rastos, atingido pelo monstro da realidade que me derrubou, trespassou e obliterou à velocidade de qualquer coisa como ‘Mach 5’. Decido afundar-me ainda mais: pego no discman, meto-me na bicicleta e saio disparado em direcção aos lugares em que estive pela última vez com a Bárbara aqui em Muros. Isto é o que me prescrevo como forma de tratamento.
Resolvo ir para a praia de Carnota com a intenção de me meter pela água dentro, pedalando até desaparecer, enquanto no discman passa repetidamente a you and me song dos Wannadies. Por fim, como seria de esperar, espalho-me ao comprido na areia, onde me deixo ficar deitado, sentindo-me como num filme em que a minha voz aparece em voz off juntamente com os sons do mar, das gaivotas e talvez do vento, apoiados por uma música ambiente qualquer. Falo agora de como a Bárbara me deixou para começar a andar com um tipo quinze anos mais velho que eu, e de como eu me fechei no quarto durante dois ou seis meses a tocar guitarra a fumar charros e a ouvir coisas como o love, hate, love dos Alice in Chains, o comin`back to me dos Jefferson Airplane ou o Crown of Thorns dos Mother Love Bone. Nessa altura pedia “tirem-me deste filme”.
(continua...)

1 Comments:

At 10:32 da manhã, Blogger susana carvalho said...

PARABENS ESTIVE A LER O TEU BLOG NÃO SEI DURANTE QUANTO TEMPO PORQUE ENQUANTO LIA O TEMPO"PAROU" E SO QUANDO ACABEI DEI CONTA DE ONDE ESTAVA ..... CONTINUA E SE UM DIA EDITARES AS TUAS MEMORIAS AVISA POIS SEREI A PRIM EIRA A COMPRAR

 

Enviar um comentário

<< Home